A Rússia anunciou nesta semana que desenvolveu uma vacina contra o câncer que será distribuída gratuitamente aos pacientes a partir de 2025. Segundo o Ministério da Saúde do país, o imunizante utiliza a tecnologia mRNA (a mesma utilizada em vacinas contra a Covid-19 da Pfizer e Moderna) personalizada.
“Com base na análise genética do tumor de cada paciente, é criada uma vacina única que pode ‘ensinar’ o sistema imunológico a reconhecer células cancerígenas”, diz o site do Centro Nacional de Pesquisa Médica Radiológica do ministério russo.
Alexander Gintsburg, diretor do Centro Nacional de Pesquisa em Epidemiologia e Microbiologia Gamaleya, disse em entrevista que os ensaios pré-clínicos da vacina mostraram que ela suprime o desenvolvimento de tumores e potenciais metástases.
Todas as informações foram dadas pelo governo russo.
Não existe nenhum estudo publicado em revista científica para atestar a eficácia e segurança da vacina ou para esclarecer para quais tipos de câncer ela será destinada. Também não há como saber se as doses gratuitas são destinadas para o tratamento da doença ou se os pacientes farão parte de testes clínicos.
“Se a gente faz uma busca no meio científico sobre a vacina mRNA russa, não achamos publicações mostrando dados. Não identificamos uma vacina que esteja sendo feita por grupo russo que mostre resultados promissores para a oncologia“, aponta Mariana Brait, gerente sênior de pesquisas do A.C.Camargo Cancer Center.
📍Estudos publicados em revistas científicas e revisados por pares têm um “selo de aprovação”. Significa que eles “passaram por um filtro”, garantindo qualidade e credibilidade. A revisão por pares é um processo em que especialistas independentes avaliam a metodologia, resultados e conclusões da pesquisa.
“Quando fazemos uma divulgação sem ter a publicação científica, sem a revisão por pares, criamos uma falta de transparência e a sociedade fica naquela situação de dúvida, se o que está sendo divulgado é sério. Quando vemos um anúncio que não está baseado em dados científicos, temos a sensação de desserviço“, completa a gerente sênior do A.C.Camargo Cancer Center.
Como vimos durante a pandemia de Covid-19, a produção de um imunizante envolve fases, onde os cientistas tentam identificar efeitos adversos graves e se a vacina foi capaz de induzir uma resposta imune, ou seja, uma resposta do sistema de defesa do corpo.
Os testes de fase 1 costumam envolver dezenas de voluntários; os de fase 2, centenas; e os de fase 3, milhares. Essas fases costumam ser conduzidas separadamente. Antes de começar os testes em humanos, as vacinas são testadas em animais – normalmente em camundongos e, depois, em macacos.
Vacinas contra o câncer
Cientistas em todo o mundo continuam estudando e desenvolvendo vacinas contra o câncer. Em Londres, pesquisadores estão testando a primeira vacina para combater o melanoma, a forma mais letal do câncer de pele. Nos Estados Unidos, uma vacina brasileira é esperança contra o câncer de próstata.
Mariana explica que as vacinas contra o câncer têm como o objetivo fortalecer o nosso sistema imune e ensinar o corpo a identificar e destruir uma célula cancerígena.
As vacinas são divididas em três categorias:
- Preventiva: vai impedir que o câncer comece. Um exemplo é a vacina contra o HPV, um vírus associado a mais de 90% dos casos de câncer de colo do útero e fator de risco para desenvolvimento de câncer no ânus, pênis, vulva, vagina e de cabeça e pescoço (uma região conhecida como orofaringe). Mariana cita também a vacina contra hepatite B, pois há câncer de fígado relacionado a esse vírus).
- Terapêutica: vai atacar as células do câncer já existentes, sempre olhando para o câncer já estabelecido.
- Personalizada: vai buscar as alterações presentes naquele câncer específico da pessoa e mirar aquela alteração. “Aqui as vacinas RNA fazem sentido, porque elas buscam alvos bem específicos”.
“Há diversas vacinas sendo estudadas no âmbito da oncologia. Vacinas de RNA sendo desenvolvidas e olhando para diversos alvos personalizados, outras desenvolvidas para um câncer específico, como o de pâncreas. Em Oxford estão buscando tratar o câncer de óvario. Enfim, temos inúmeras vacinas em desenvolvimento”, completa a especialista.
Fonte: G1